domingo, 23 de novembro de 2014

Um dia de cada vez

Esta é certamente uma das frases mais gastas e sugeridas neste começo de século. “Viver um dia de cada vez”. Esta frase faz-nos pensar no quão precioso é a vida e qual o nosso modo de estar perante as várias adversidades ou conquistas durante a nossa existência.
 Mas será que se pensarmos em modo de “viver um dia de cada vez” não irá afrouxar os nossos horizontes? Não irá limitar os nossos pensamentos a longo prazo? Não será um desalento e um enorme desconforto pensar que amanhã poderá ser tarde, ou simplesmente não existir? Será que o pêndulo oscila tão descontroladamente que nos ofusca a visão, e nos impede o equilíbrio? Talvez seja para nos poupar de pensar num futuro tão assustador e acidental e concentrarmo-nos simplesmente no agora. Pode ser tudo isto, mas mesmo assim prefiro pensar que o depois existe e não há necessidade de convivermos como se fosse a ultima vez. Viver intensamente sim, mas sempre com o intuito de compartilhar, de progredir, sempre em modo racional.
Por outro lado, é intrínseco ao ser humano a sua realização e a sede de chegar longe. Ora neste mundo tão selvagem é necessário munirmo-nos de rapidez, sem pendentes ou atrasos. Aqui está o outro lado da moeda. É obrigatório compreender que à velocidade com que tudo acontece neste mundo tão global, basta uma ligeira distração e já só apanhámos a última carruagem. Torna-se inevitável a corrida contra o tempo. Não podemos deixar para amanhã, porque entretanto o comboio desta nova era já passou e aí sim o amanhã já aconteceu ontem. Mas qual a motivo de tanta urgência? De tamanho descomedimento?
 Neste momento a resposta mais frequente é a crise. Mas não será consequência da míngua e negativa oferta do mercado de trabalho que teima em não satisfazer as necessidades do povo? Serviços que durante décadas foram desadequados e transformaram a nossa sociedade demasiada consumista e desigual? Será ainda a natural insatisfação pelo existente? Ou a necessidade imparável que o ser humano tem de se afirmar como o todo-poderoso? Quem sabe se não é apenas um simples descontentamento ou uma desmedida ambição?
De qualquer modo não podemos esquecer o equilíbrio necessário, a audácia, empenho, bom senso e criatividade. Fatores determinantes para uma geração que se quer afirmar no mundo e ser reconhecida entre os maiores (melhores), legando uma comunidade competente e produtiva. Esta frase, “Viver um dia de cada vez”, com que nos identificámos ou não, irá permanecer e juntar-se a outras de igual modo assente em determinada época da nossa história. Acredito que esta expressão seja considerada sempre pela positiva e sinónimo de bom prenúncio.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Faz de conta


Todos nós necessitámos de brincar ao faz de conta, fugir da realidade e por momentos fantasiar, reviver a infância, a brincadeira e desta forma podermos adotar procedimentos que de outro modo não nos é permitido. É muitas vezes através das personagens que encarnámos que transpomos as nossas experiências, os nossos valores. Dar uso à criatividade, explorar recursos, ser capaz de criar personagens, dominar a expressividade, estimular o relacionamento interpessoal é um processo que vamos aprendendo, com base no conhecimento e na formação individual, mas é principalmente através das vivências que podemos dar a conhecer outros pensamentos, incitar o outro a questionar, a pensar de modo diferente e mais ousado. Nada nos reprime, pois ao faz de conta quase tudo é permitido. Quase? Sim quase! Pois mesmo ao faz de conta não podemos ferir suscetibilidades, não nos é permitido desrespeitar ou descriminar. No faz de conta devemos estar providos de conteúdos para melhor os transmitir. 

domingo, 26 de janeiro de 2014

Carências

Todos nós sentimos falta de algo ou de alguém. Necessitamos de tempo, de dinheiro, de trabalho, de férias, de apetite, de vontade, de amigos, mas é sem dúvida na família que o nosso coração mais chora. É indiscutivelmente aqui que a nossa garganta fica demasiado apertada, tornando o ar que respiramos insuficiente para a nossa existência. Mas, como contrariar todas estas necessidades? Como obter um pouco de tudo isto sem prejuízo para o nosso bem – estar? Será um processo simples? Acredito que sim. É necessário dar, dar de nós, distribuir um pouco do nosso precioso tempo, prescindir de algo em prol do outro, temos que semear. Semear palavras, evidenciar atitudes, difundir sentimentos, espalhar o que de melhor existe nós. Descentrarmo-nos do nosso singular umbigo será certamente o início de uma colheita promissora, mesmo que a semente não consolide de imediato. Se não compartilharmos, se não dividirmos com os demais, o retorno será nulo e por vezes até acusador. É frequente assistirmos a inúmeras cobranças, somos seres insatisfeitos, mas se estivermos atentos, verificámos que onde a semente mais careceu foi em prejuízo de sentimentos e emoções. 
Emprestar um pouco do nosso tempo a ouvir testemunhos dos nossos avós ou de pessoas mais velhas é de fato enriquecedor e caloroso, sem esquecer que nestes momentos apadrinhámos uma imensa necessidade de afirmação. São histórias simples, mas com uma enorme dose de carinho e satisfação por poder partilhar. As vivências e passagens anteriores servem para aprender ou corrigir algo. Escutar, educar, transmitir e partilhar conhecimentos, são muitas vezes relatos de memórias que ajudam a compreender e a compreendermo-nos, tornando a vida mais simples e a inexistência menos presente.
À falência de emoções e vontades eu denomino de carência de viver. Uma vida sem objetivos ou ambições facilmente culmina na maior pobreza de existência.